Lágrimas Indesejadas.
Anita jurou não chorar naquele momento. Era orgulhosa e não daria o sorriso de desdém para as suas rivais do concurso de “Garota da Praia”em Salvador, Bahia. Queria o rosto com um sorriso indecifrável, quase uma Mona Lisa, só que alguns quilos mais magra.
Ficou em quarto lugar na classificação geral. Conseguiu não chorar. Conseguiu um sorriso de quadro, estático e perfeito. Chegou em casa. Disse que estava satisfeita com o resultado. A família a abraçou. Mãe, tios, primos. Até o seu pai, que não morava com a sua mãe, mandou um torpedo pelo telefone celular.
Festa para as cinco finalistas. Vestido, colar, sapatos de salto, alegria. A moça de cabelo arrumado junta com as outras beldades da orla. Fotografias. Olhares dos rapazes afoitos para ficarem com elas. A campeã e a vice tinham namorado, as outras três estavam desacompanhadas. Júlia e Otávio, Alessandra com Roberto.
Dança. Houve uma pré-seleção dos rapazes que dançariam com as garotas desacompanhadas. Um dos rapazes, Marcos, conseguiu o telefone de Anita.
Ele e ela namoravam. O clima, as areias, a brisa suave que vinha do mar, tudo propiciava o encontro.
O namoro termina quatro meses depois, no dia em que Anita ouve que ele vai embora para Porto Alegre. Ele tem novas experiências pela frente e ela quer novas experiências na sua vida também.
_Se for o caso, voltaremos; se não for o caso, valeu a experiência.
Sem lágrimas. Eles simplesmente se descartavam naquele momento.
A vida continua e a fila tem que andar. É assim que funciona hoje em dia.
Vieram os compromissos e o emprego. Pagando as contas no final do mês está bom. Não quer vida de “Garota de Praia”. Batalha incansavelmente na venda de lembrancinhas da cidade. A sua loja fica no centro da cidade. Conhece muita gente. É popular, antenada e pega no ar o que vai ser o próximo produto a ser bem vendido.
Desde o tempo daquele concurso que ela não consegue chorar. Faz força, às vezes vem o nó na garganta e nada. Seus olhos se parecem com a seca do sertão. Dolorida, sem esperança de água. A secura dos olhos a incomoda. A seca parece que vem de dentro, a alma rachada e desprovida de sentimentos de dor.
Lembra que naquele tempo do concurso praticou auto-sugestão e sugeriu a si mesma que deixaria os seus olhos extravasarem no dia em que ficasse sozinha e tranquila. Passaram dez anos e nada. Bem é verdade que dificilmente fica só. Clientes, amigos, família. Tinha gente por perto todas as horas do dia. Dia vazio é dia de limpeza e a moça não falta. Se os fatos continuam assim, ela não usa lenços pelo resto da sua vida.
Até o dia dos festejos da cidade no dia vinte e nove de março de 2.009. Assistiu a festa. Salvador de ressaca no dia seguinte, ela dá um tempo e vai passear. Não encontrou nenhum conhecido. Estava só. Delícia. Andar pela orla sem encontrar ninguém. Parece que o nariz trancou. Os olhos ficam irritados. Chuva no rosto. A tão sonhada chuva desaba num rápido temporal. Corre para uma lanchonete. Compra um suco e deixa em cima do balcão. Pergunta onde fica o banheiro. Pega uma toalha de papel de enxugar as mãos. Entra no espaço reservado. Assoa o nariz. Limpa os olhos como pode com aquele papel áspero
Sai do banheiro com uma expressão aliviada, os olhos ainda lacrimejando.
A dona do lugar pergunta se ela se sente bem. Ela responde que sim. Compra um bolinho de bacalhau, come, toma o refrigerante e sorri. Finalmente feliz.
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