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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

O Tutor

O Tutor

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Eram dois amigos muito íntimos, um deles, viúvo e doente.

Sabendo da doença do amigo viúvo que tinha uma única filha, Fernão perguntou ao amigo se ele gostaria que ele, Ernani, cuidasse da moça.

Ernani disse que sim. Era homem rico e gostaria que o dinheiro fosse entregue à filha somente depois da sua maioridade. Era muito dinheiro para deixar sob a responsabilidade da jovem de dezesseis anos.

Fernão também era dono de muitos negócios e compreendia a preocupação do amigo.

Chegou o momento final e Ernani faleceu,

Fernão comunicou à Noêmia a vontade do seu pai Ernani. Disse que nada faltaria na sua vida de jovem.

Noêmia foi para casa, e pôs-se a imaginar como seria o seu futuro, sem saber ao certo o que aconteceria dali em diante.

Passam-se algumas semanas e, estando ela com a empregada Deolinda, a encarregada de auxiliá-la contratada por seu pai, bate à porta Fernão.

Fernão, disposto e atencioso, chegava com a psicóloga. Contou à Noêmia da sua habilidade com os jovens e disse que através de alguns estudos sobre a vida da jovem, ela precisava falar-lhe.

Noêmia não sabia o que dizer. Deolinda foi providenciar um suco de frutas para servir as visitas.

Depois das apresentações, a psicóloga contou da análise comportamental feita e da observação do problema observado.

_Noêmia, você é uma jovem normal e não há muito com o que se preocupar. Porém você tem uma sinapse negativa e é a minha obrigação profissional alertá-la. Conforme todos sabem, você foi uma criança feia. Embora você mesma não tenha conversado sobre isso, é importante observar que essa realidade a faz se sentir insegura. Você tem que lidar com isso, se bem, que pelo o que observo, o problema foi resolvido.

Deolinda chegou da cozinha com suco de frutas para todos. Disse ao Sr. Fernão que agradecia em nome da Noêmia todo o trabalho de contratar uma psicóloga para analisar a menina. Perguntou a psicóloga em que ela mesma poderia ajudar a garota.

A psicóloga deu o cartão de visitas e disse, que em caso de dúvidas a procurasse no consultório.

Deolinda agradeceu muito e disse que a menina não dava trabalho ou preocupação, mas caso fosse necessário iria procurá-la. Seria bom ter com quem contar.

O tutor, homem de negócios, viajava constantemente. A psicóloga era a encarregada de tomar as providências para que a garota crescesse saudável.

Deolinda assumiu a garota como se fosse da sua família e disse à Noêmia que deixasse a psicóloga por conta dela.

Numa tarde, Noêmia volta para casa chorando, o seu namorado havia levado uma surra de alguns homens mal encarados.

Deolinda abraçou a menina e disse:

_Presta atenção, Noêmia. Eu sou pobre. Eu não posso evitar o que acontece, mas eu posso te contar quem faz. É gente que não tem dó no coração. Eu sei que a surra foi mandada porque vieram dois moços bem arrumados, filhos da psicóloga e queriam saber se você andava espichando os olhos para algum moço na cidade. Eu disse que não sabia. Quem conversa com a psicóloga sou eu, você não merece ser tratada como salário de psicóloga.

Noêmia entendeu a situação na qual se encontrava. Estava num mato sem cachorro e a Deolinda era a pessoa certa para ter com quem contar.

Passou-se mais algum tempo. Chegaram três homens. Eram da imobiliária. Queriam avaliar o imóvel.

Noêmia estava em casa e disse que o imóvel não estava à venda.

_A moça pode mudar de ideia. Quem sabe se conversarmos daqui a alguns anos a moça não perceba que existem lugares melhores para uma criança bem nascida.

Noêmia treme. De repente, o pai dela não era bem relacionado, aquele tutor começava a desagradá-la.

Deolinda chegou, estava em casa e tinha ouvido a conversa.

_Noêmia, deixe-me conversar com eles da próxima vez. Você não sabe lidar com isso.

Enquanto a garota foi para a escola, os homens da imobiliária chegaram a casa. Disseram que vieram fazer a avaliação para a venda da residência. O Sr. Fernão tinha planos para transferir a menina de escola e de lugar.

Deolinda, calma, conversou com os homens e explicou a situação:

_O Sr. Fernão é muito atencioso, mas ele se esquece de que deverá entregar à Noêmia tudo o que o pai dela deixou. Ele terá que entregar essa casa também para que ela decida o que fazer. Agora ela tem idade ou juízo para pensar nisso. Ela gosta daqui, das lembranças da mãe e do pai dela, do jardim todo plantado com margaridas, seria malvadeza com a menina. Os senhores podem deixar por minha conta. Eu converso com o Sr. Fernão quando ele vier aqui trazer o dinheiro da escola.

Diante da resposta, os homens da imobiliária foram embora, profundamente irritados com a negativa da empregada, que mesmo recebendo a oferta de recompensa, não permitiu que a avaliação fosse feita.

A amizade de Deolinda e Noêmia era tão perfeita que as duas desconfiaram da situação.

Noêmia pediu para que Deolinda ligasse para a psicóloga e perguntasse se ela ou o Sr. Fernão não fariam mais nenhuma entrevista dela com a psicóloga.

A psicóloga disse que estava tudo bem e que não havia necessidade.

Noêmia folgou com a notícia. Deolinda não. Perguntou para as conhecidas se alguma delas conhecia a empregada da casa do Sr, Fernão. Uma delas conhecia.

_Eu acho estranho que o Sr. Fernão não convide a menina para passar uns dias com ele. Ele tem família e se, ele quer que ela tenha bons relacionamentos, seria bom para a Noêmia fazer novas amizades.

A empregada do Sr. Fernão pediu para que Deolinda não tocasse no assunto.

_A menina é boa e não dá trabalho a ninguém, ela não incomoda. A família dele vê essa situação com maus olhos. Ah, desculpe te dizer, mas você é simples como eu e entenderá o que eu digo. É uma garota criada por empregada. Ela é que não é boa companhia para a família dele. Depois ele quer cuidar da situação, não quer se envolver com essa situação. Eles pensam diferente da gente. A gente tem que entender que a vida deles é outra.

Deolinda, com muita delicadeza, chamou a garota para contar o motivo porque aceitaram que ela lidasse com a psicóloga.

_Eu penso que hoje amadureço Deolinda. Com essas nossas dificuldades, estou aprendendo a lidar com a vida. Sou só e a situação proporciona tal liberdade para pensar, então, por que não aproveitarmos para planejar o futuro da maneira que pudermos. As propriedades são minhas e o tutor é transitório. De hoje em diante, apenas o futuro nos interessa.

Deolinda concordou.

Com a vida cheia de planos, Deolinda se descuidou das tantas satisfações que dava à psicóloga. Atendia os passeios de Noêmia, que ela mesma cuidava de não dar na vista de Fernão; estavam felizes.

Fernão coçava a barba. Os seus planos de venda da casa não deram certo. Ninguém reclamava de nada. Estava na hora de saber como as coisas andavam pelos lados da casa do amigo. Pensou muito e conseguiu um plano.

Chegou à casa de Noêmia e disse que gostaria que Deolinda fosse trabalhar para ele.

Noêmia, embora educada nos últimos tempos por Deolinda, conservava alguns hábitos da educação anterior, conselhos recebidos da mãe e do pai enquanto vivos.

_Eu sinto muito Sr. Fernão. Estou com dezenove anos e não permitirei que o senhor tire a empregada da minha casa.

Noêmia falou do jeito que Deolinda desaconselhava. Ela era a empregada e a Noêmia acabava de agir como se ela fosse a sua mãe.

O Sr. Fernão riu-se da infantilidade da moça.

_Ela irá trabalhar na minha casa enquanto você estiver viajando. Uma moça fina precisa viajar e é minha obrigação zelar por você.

Deolinda concordou com ele.

_Certamente, Sr. Fernão. Eu fico imensamente que a menina conheça outros lugares. O senhor pretende que ela fique quanto tempo fora?

Fernão teve que responder enquanto calculava o quanto poderia disponibilizar para que a moça viajasse.

_Quinze dias!

Deolinda sorriu e abraçou Noêmia.

_Parabéns, querida.

Noêmia viajou e se deslumbrou com as paisagens jamais vistas.

Na volta da viagem, chegou a sua casa para abraçar Deolinda, mas ela ainda trabalhava na casa de Fernão.

_Sr. Fernão, o senhor poderia mandar a Deolinda de volta para casa? Eu trouxe roupas sujas na bagagem e preciso de alguém para me ajudar.

Fernão disse que gostou muito do jeito da Deolinda e que ela ficaria mais alguns dias com ele.

Noêmia lembrou-se da educação recebida pelos pais e da educação recebida através da Deolinda.

_Sr. Fernão, o senhor foi muito gentil ao me proporcionar tão encantadora viagem, mas eu preciso de ajuda. Estou com muitas fotos e as quero guardar em álbuns. Tenho as malas a desfazer. Tenho a escola na segunda-feira. Eu peço com toda a humildade de quem está agradecida para que o senhor permita que ela volte agora mesmo para me ajudar.

Naquele momento, Fernão sentiu-se orgulhoso da viagem que proporcionou para a filha do amigo, órfã da sorte. Deolinda havia trabalhado bem e mostrou-se boa pessoa. Permitiu que a empregada voltasse para perto da sua tutelada.

Noêmia contou todos os detalhes da viagem para Deolinda, que não entendia muito bem, mas sabia que o contar era sinônimo de querer bem e a ouvia com muito carinho.

Assim, os planos para o futuro recomeçaram ambas sabedoras que planos existem para serem modificados de acordo com as circunstâncias e as necessidades.

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