Era uma vez um castelo sombrio no alto de
um morro. Era conhecido pela população das redondezas como o mausoléu dos
imaturos. Todos temiam passar por perto porque a sua entrada mais parecia um
cemitério.
De tantos avisos, mistérios e histórias sobre
o lugar, certo dia, um pesquisador se interessou em desvendar o mistério que
rondava o lugar.
Para passar-se despercebido, João
vestiu-se de mendigo em busca de um prato de comida.
Pegando o caminho em direção ao castelo
observou os corvos e os uivos dos lobos. A entrada do castelo era um caminho de
cruzes simbolizando cada criança morta.
Preparado para o que pudesse encontrar,
João seguiu até a porta. Chegando lá, bateu à porta para pedir comida.
Abriu a porta uma mulher de olhar estranho
e penetrante, perguntando o que ele desejava.
_Um prato de comida, senhora.
Ela soltou uma gargalhada dizendo que ali
ele não ganharia nada que não fosse trocado.
O mendigo perguntou o que ele poderia
fazer que pudesse ser trocado por um prato de comida, pois nada tinha de seu,
nem mesmo habilidades para oferecer.
A mulher, ao invés de responder a questão,
perguntou se ele não tinha família ou amigos que o acolhessem.
_Não, senhora. Deixei as minhas terras há
muito tempo. Todos sabem daquele vendaval que destruiu boa parte do oeste,
arruinando moradias e plantações, deixando apenas sobreviventes da calamidade.
Assim como os outros infortunados eu saí em busca do que fazer e do que comer,
mas não encontrei.
A mulher sorriu, satisfeita. Contou que
tinha uma criação de cabras num lugar próximo dali e que ele poderia comer
cuidando das cabras.
O mendigo aceitou. Disse que estava
faminto e, comeria o que lhe viesse aos dentes.
João foi conhecer o terreiro. Enquanto limpava
o local, procurou uma árvore alta e troncuda para ali construir uma casa.
Procurou madeira boa para fazer uma casa na árvore e começou a construí-la.
A mulher, dona do castelo, ao perceber o
movimento do João, foi conversar com ele.
_O
que é que o senhor está fazendo na árvore? Do terreiro à árvore o senhor foi
muito rápido.
João disse que essa era a maneira que ele
encontrou para cuidar do terreiro à noite. Contou que ouviu os uivados dos
lobos e tinha medo de ataques de lobos famintos. Se ele estivesse lá em cima, à
noite, poderia defender as cabras e se proteger ao mesmo tempo, caso aparecesse
alguma matilha.
A mulher concordou com ele, mas disse a
ele que não tornasse a agir sem antes falar com ela.
João pediu desculpas e disse que nada mais
faria sem a sua permissão.
O pesquisador continuou, entretanto, com
os propósitos que o levaram até ali: vigiava o castelo à noite e cuidava das cabras
pela manhã, dormia durante as tardes sobre a relva próxima ao terreiro.
Passados alguns dias, numa noite, João viu
a porta do castelo se abrir. Desceu da árvore e, entre arbustos, seguiu a
mulher.
Ela passeava por entre as casas dos
aldeões parecendo procurar por algo.
De repente, ele percebeu que ela deteve os
seus passos atenta ao burburinho de algumas crianças junto aos seus familiares.
Aproximou-se daquela casa.
De longe, João observou que a mulher entrou
na casa, ficou lá pouco tempo e saiu em direção ao castelo.
João pensou em segui-la no caminho de volta,
mas o luar era alto e ele não quis ser visto; decidiu aguardar que ela seguisse
o caminho.
Enquanto ele observa os passos da mulher
se distanciando dali, ele ouve as crianças discutirem e gritarem.
Inquieto, ele vai até aquela casa e bate à
porta.
_Peço um prato de comida, há dias que não
faço uma refeição. Há alguma sobra de alimentos que possa ser oferecida?
O garoto abre a porta e é ríspido com o
mendigo:
_O senhor não será atendido, pois, neste
exato momento, estamos com problemas. Aliás, problemas sérios.
João pediu permissão ao garoto para
aguardar até o amanhecer nas redondezas. Disse que não pretendia incomodar.
Antes de partir, na manhã seguinte, ele pediria um prato de comida para os seus
pais.
O garoto disse que ele parecia não entender
e, explicitou a situação:
_O meu pai, agora, é meu irmão e, a minha
mãe, foi transformada em minha tia.
O mendigo disse que não entendeu nada do
foi dito e que estava ali em busca de um prato de comida.
O garoto, nervoso, apontou para a
cabeceira da mesa mostrando um jovem de vinte e um anos. Depois, apontou para a
mulher de trinta e poucos anos dizendo para a garota, sua irmã, que, se ela
fosse sua filha a educaria de maneira diferente. A garota gritava que era mentira.
João, fazendo-se de conformado, disse que
no caminho até ali avistara uma mulher e, quem sabe ela poderia arranjar um
prato de comida para ele. Perguntou ao garoto se ele sabia quem era ela e onde morava;
quem sabe ela tivesse comida para dar.
O garoto disse que ela era a dona do
castelo e fora até ali oferecer o castelo para a família fazer um piquenique
lá. Ela foi lá para dizer que eram bem vindos ao castelo.
A garota, sua irmã, ouvindo a conversa,
disse que era boa ideia procurar aquela mulher e pedir ajuda.
João, incomodado com a sugestão dela,
interveio, dizendo que seria muito perigoso deixar o pai, que agora era quase
tão jovem quanto ele, em casa, a obedecer à mãe, que agora estava transformada
em tia e queria modificar a educação deles.
O garoto e a garota concordaram com o
mendigo.
João disse que iria até o castelo pedir
comida e, depois, voltaria até a casa deles, talvez até com a ajuda daquela
mulher.
As crianças acreditaram nele. Era noite e
o caminho estava escuro. Ele era um homem faminto e estava acostumado com
trilhas; eles, não.
O mendigo foi até a casa na árvore e
observou que os candeeiros do castelo ainda ardiam. Esperou amanhecer e foi
conversar com a mulher.
_Bom dia, senhora. Passo por aqui para
dizer que o terreiro está limpo e, as cabras, alimentados. Também estou com
novas ideias para melhorar o local tais como uma cerca nova e algumas melhorias
na casa da árvore.
A mulher olhou para o João e disse:
_Não me importune! Se você tiver alguma
ideia sobre a casa da árvore, eu o coloco para fora daqui.
O mendigo disse que tinha se ofendido e
que, se assim fosse, ele é que iria embora do lugar.
_Vá embora!
Ele foi embora para a casa das crianças,
que o aguardavam com a ajuda.
O mendigo chegou lá e disse:
_Se o pai de vocês agora é o irmão e, a
mãe de vocês agora é tia, a solução é que eu seja o avô.
As jovens crianças perguntaram se a dona
do castelo tinha dito isso ou se era invenção dele.
_Ela me deu até mesmo roupas de avô e
disse que tudo será resolvido, mas ela pediu segredo porque, segundo ela, o
segredo é a alma do negócio. Vocês não sabem, assim como eu não sabia, mas ela
disse que eles sofreram um feitiço que pode ser desfeito. Nós não falamos mais
nisso. Nem eu, nem você e nem ela; assim o feitiço será desfeito.
Os dois concordaram com o João.
À noite, a mulher, dona do castelo, bateu
à porta novamente, dizendo que trazia flores para a mãe deles. Desta vez, quem
atendeu a porta é João:
_Eu sinto muito, senhora, a minha nora
deitou-se cedo, mas pode deixar; eu entregarei as flores.
A
mulher, desconfiada, fingiu que foi embora, mas ficou nas imediações para ver se
descobria onde tinha errado. Esperou pela discussão. Aguardou que uma das
crianças se exaltasse e fosse até o quintal para que ela pudesse levá-la
consigo.
Ao invés da discussão envolver as
crianças, ela se dá entre o pai e o homem que se passa por avô das crianças.
_O senhor não é da família e eu não permiti
a sua entrada em minha casa.
À medida que João conta que é pesquisador
e que procurava saber sobre o castelo sombrio da região, o pai das crianças
volta a ter a sua idade normal e se coloca na posição de chefe da casa.
A mulher, ao ver o marido discutir com o
intruso, reage positivamente à situação, assumindo a condição de mãe:
_O meu marido está certo, nossos filhos
precisam de proteção e a mãe deles sou eu.
João pede desculpas por sua intromissão na
família e sai da casa deles, deixando as crianças felizes por verem o seu pai
adulto e a sua mãe desenfeitiçada.
A dona do castelo o aguarda a poucos
metros dali.
_Quem você pensa que é para se intrometer
com os meus planos? Agora, você irá ao castelo comigo e saber quem sou.
João vira-se para a mulher e diz que ele é
o destino pelo qual a mulher procura. Estendeu os braços e seguiu com ela ao
castelo.
Chegando ao castelo sombrio, ela abre a
porta e o convida para entrar.
Tudo o que há lá dentro são catacumbas.
A mulher abre uma delas e diz que é ali
que ela dorme. Transforma-se a si própria numa linda borboleta negra e pousa
dentro da catacumba fazendo um barulho terrível.
João não perde tempo e fecha a catacumba,
travando-o por todos os lados.
Depois,
pegou os apetrechos que utilizava para cuidar do terreiro e levou a catacumba
de ferro para a porta do castelo, cimentando-o ali por debaixo da soleira, de
tal modo que ninguém a conseguisse abrir. Ainda escreveu sobre o caixilho: Aqui
jaz o ódio. Feito o desfeito, João seguiu o seu caminho.
Um comentário:
... mistériooooo... história bem vampiresca mesmo... mas em alguns parágrafos pude associar com o nosso hoje em dia... O poder... O levar vantagem... O ludibriar... quando tentam depreciar nossa capacidade de "pensar"...
Abraço.
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