Dispensa a Mercedes!
O homem, João, chacreiro levava uma vida modesta e vivia das safrinhas sazonais. Casado, não sossegou enquanto o terceiro filho não nasceu. O mais velho chamava-se Joaquim, a do meio, Constantina e o último Manoel. Três filhos eram à conta da velhice e João, não cansava de aconselhar os amigos nas peladas dos fins de semana.
_ Não percam tempo. Se vocês se distraírem, ficam velhos e, cadê os ajudantes para a velhice. Dividam as obrigações dos filhos para com vocês e, se a onça não passar no terreiro antes da doença, vocês não pesarão na vida deles. Um cansa, o outro ajuda e a do meio reclama que você não deu atenção. Velho e sossegado, vocês e as suas amáveis cúmplices na hora do trabalho de parto. Vamos reconhecer, elas dão uma ajuda danada na vida da gente.
João e a sua filosofia de vida faziam rir os amigos.
_Não tem desculpa para não tratar dos dentes. Eu marco hora na universidade, os estudantes me atendem, os professores avaliam o tratamento e a família fica com um sorriso bonito na fotografia. Melhor que isso, todo o mundo lá em casa come leitão crocante sem reclamar. Qual é a vantagem da safrinha, da venda, se eu não puder comer? A mastigação garante o bucho em bom estado de conservação. O meu bucho bem tratado.
Contador de história, bom de prosa e confiado, o grande fazendeiro da região, de apelido Turrão, resolveu aprontar uma pegada para ele. Em um dia de tempo seco, pegou o seu carro de luxo importado e foi até a chácara do João.
_João, deixarei o Impala aqui para te ajudar. Pode usá-lo para ir à cidade, no campo, virei buscar o carro daqui a três meses. Foi-se embora pensando que o João iria usar o automóvel e por certo estragá-lo. Sem contar que o automóvel era segurado, foi-se embora deixando o carro estacionado ao lado da cerca. João tinha um trator velho e não sabia dirigir.
João não mexeu no carro e continuou com as safrinhas, o trator e a contação de vantagens aos amigos de sempre.
Nesse meio tempo choveu, fez sol, e o Impala no tempo. Na chácara não tinha garagem porque não tinha automóvel.
Passados os três meses, Turrão chegou para buscar o carro.
_João, o meu carro está atolado?
_Choveu Turrão.
_João você não saiu, não experimentou o possante?
_Eu estava plantando e colhendo Turrão.
Turrão, irritado, perguntou como é que ele iria tirar o carro coberto até as portas de barro.
_Eu pego uma corda e amarro no trator. Eu ajudo e dispenso a Mercedes para o senhor.
_Não é Mercedes, é Impala!
_Não adiantou Turrão, eu tentei limpá-la, mas o tempo não ajudou. Turrão, você e a sua mulher têm três filhos?
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