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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

A Vitrinista

A Vitrinista

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Rafaela tinha a vida profissional realizada, era vitrinista conceituada, bem quista por todos os lojistas pelos preços moderados em comparação com a qualidade dos serviços prestados. Para ela, a quantidade de vitrines era a que conseguisse decorar durante o mês e o seu preço era de acordo com a sua agenda, sempre lotada, mas a tempo de atender o público consumidor. A vitrine era a casa de bonecas que não teve na infância; no seu trabalho criativo chegava a colocar nomes nos manequins que vestia e calçava. Criava o mundo deles de acordo com a estação do ano e com a personalidade de estilo nas roupas usadas. Vivia de sonho em sonho, emprestava-os a quem passasse pela frente das lojas.

Era bom compensar a sua falta de sorte na vida afetiva naquelas vitrines. No entanto a esperança de encontrar o outro homem que a faria feliz persistia. O divórcio fora amigável, Victor contraiu segundas núpcias com outra mulher, mas eles eram amigos e trocavam ideias sobre a educação de Júlio, filho do casal.

Depois de alguns namorados, ela conheceu o homem que queria. Dizia fazer tudo por esse relacionamento. O namoro ficou sério, as famílias se conheceram, Victor desejou boa sorte.

Rafaela e Gabriel, esse era o nome do namorado, a escolha que daria certo. Eles se casaram.

Gabriel não queria que ela continuasse vitrinista e sim desenhista industrial. Ele vinha de outro mundo, o mundo corporativo. Este seu mundo pensava ser falta de consideração para com a esposa mantê-la neste posto técnico que não exigia grandes qualificações profissionais segundo a sua classe.

_Rafaela, eu quero que você esteja à altura do meu mundo corporativo. Casamos, o seu filho Victor estuda numa boa escola, vivemos bem, mas eu quero que você faça mais por si mesma. Sabemos que as exigências deste nosso mundo aumentam a cada dia e pelos nossos cálculos, em poucos anos você será uma profissional obsoleta.

“Obsoleta”. Ela, que se especializava a cada dia e que fazia as melhores vitrines; ela, que tinha os melhores contatos e poderia se aprimorar do jeito que quisesse porque tinha patrocinadores. Rafaela ficou sem saber o que dizer.

_Rafaela, consegui. No mundo corporativo, podemos muito. Aqui está a sua vaga no curso preparatório que te levará a uma universidade estrangeira. Imagine! Sem vestibular! Você estuda e , quando se sentir preparada, se apresenta para os exames.

Entre a casa de bonecas das vitrines e a vida real, de acordo com os conhecimentos do marido, ela teria que escolher.

O marido era um profissional bem sucedido e mais bem pago do que ela, porque ele sonhava salário e ela sonhava bonecas.

Ela refletiu e se lembrou da primeira separação. No fim do primeiro casamento ela fora autêntica e de igual peso nas decisões. Não voltaria a se separar de novo, ele era um bom homem dentro e fora de casa. Aceitou o presente.

Rafaela era a manequim da vitrine na vida de Gabriel. Ela sentia o casamento ruir a cada dia nos seus sonhos, sonhava bonecos, brincava marido. Nasceu uma nova Rafaela nessa crueza de conceito aceito, e sem querer, fortaleceu a submissão da mulher nos tempos modernos.

Aos poucos, despedia-se dos lojistas e avisava que não mais seria vitrinista, o mundo do seu marido exigia mais. Até quando iria aquela submissão ela não sabia, mas falava amargo. A Rafaela das vitrines reclamava, mas a Rafaela inserida no mundo do marido aplaudia e dizia que assim seria melhor para a família que nascia de novo.

A submissão era uma postura adotada livremente, mas adotada em nome da vida feliz, de acordo com os preceitos técnicos do mundo do marido. Se ela se arrependeu não saberemos, ela não foi mais a Rafaela que conhecemos anteriormente, mas sabemos que ela está dentro das convenções de tudo aquilo que não é dito.

3 comentários:

Teresa Brum disse...

Hum, imagino que nunca mais foi feliz, ninguém é feliz não trabalhando no que gosta, eu não seria nunquinha...beijinhos

Edum@nes disse...

Quando não se fazer
O que se gosta
Feliz não poderá ser
Contra a vontade se revolta
Mas para salvar algo obedecer!

Ao seu trabalho renunciou
Para não contrariar o amor
A si própria se contrariou
Decisões do marido terem mais valor!

Boa sexta-feira, um abraço
Eduardo.

Unknown disse...

Bom fim de semana.

Abraço.