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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

sábado, 19 de setembro de 2015

Oficina de Livro

Oficina de Livro

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Numa escola secundarista a professora de literatura reuniu os alunos para um estudo prático. Dividiu os alunos em equipes e pediu a cada grupo que fizesse um trabalho sobre literatura.

O trabalho ficaria a critério das equipes desde que não fugisse ao tema literatura. A criatividade e a originalidade valeriam pontos nas notas e ela não queria resumo ou a cronologia literária dos períodos ensinados em sala de aula.

Uma das equipes decidiu fazer um cronograma com personagens de um livro que eles escreveriam quando tivessem uma folga. Cada membro da equipe comporia um personagem com características pessoais e o líder da equipe, como se membro da equipe fosse, teria que colocar os personagens elaborados como parte do livro.

Assim os personagens começaram a surgir e foram anotados.

_O meu personagem é um ilustre falido que tem a vaidade de fazer da falência algo bom para a sua vida. Ele é sonhador, determinado e confiante e, ao mesmo tempo em que têm essas qualidades, não perde as marcas que a falência financeira trouxe dizendo de coração aberto sobre as desgraças que as falências trouxeram aos outros, tornando-se patético aos olhos de muitos.

_A minha personagem é uma mulher filha dos fugitivos de uma guerra. Ela é extrovertida tanto para o riso quanto para os debates necessários, exigente e ingênua. O seu ponto fraco é a credulidade, pois ela vê o mundo como os que se salvaram das guerras o veem, um mundo que tem tudo para ser feliz e não sabe aproveitar o momento que passa.

_O meu personagem é o personagem proscrito. Será apagado dos livros de história e a sua lembrança causará pânico porque ele é a verdade que não interessa. Será o culpado pelo que não fez, embora jamais tenha sido inocente. O ponto fraco do personagem é a tendência a pensar que conseguirá superar as fraquezas humanas.

_O meu personagem é carismático pela atuação, algo entre o singelo e o absurdo, colocando o livro em tensão porque o leitor poderá sorrir com ele, chorar por ele, torcer por ele, filosofar com ele questionando as suas impossibilidades e crer em Deus por causa dele. Ele é verdadeiro e egocêntrico às suas vontades que são sempre curiosas e úteis.

_A minha personagem é a romancista, a narradora da história. Alguém que sabe a realidade, mas também sabe que o sonho impossível é uma possibilidade. Na mesma medida em que a narradora procura a imparcialidade na história, ela toma posições a favor e contra cada um dos personagens e toma as suas decisões a partir do desenrolar da história, modificando-se até o final da história sem perder a linha de continuidade do livro.

O líder da equipe disse que todos estavam sendo bons e ele precisaria de personagens maus.

Os estudantes pensaram e escreveram os seus personagens maus.

_O meu personagem mau é um homem sem nobreza de espírito e é apegado aos bens materiais a pontos extremos como observar a avareza como princípio de economia. Ele maldiz a quem passa numa confeitaria quando é falido. O seu ponto fraco é que ele é instrumento para os sentimentos mais vis.

_A minha personagem má aproveita-se de todas as carências e confidências feitas a ela para promover os seus interesses.

_Ah, eu não tenho personagem mau. O meu personagem mau é tudo o que não é dito, é o lado obscuro que fica à descoberto nas possibilidades, nas escolhas errôneas e nas necessidades infames. É algo que existe e permeia a humanidade e estão em todos os lugares, coisas do mundo.

_O meu personagem mau é mau, diz que é mau, gosta de ser conhecido como mau e acha que a vida será melhor no dia em que as pessoas deixarem de ser burras e pararem de pastar. É um personagem mau e estereotipado e o seu ponto fraco é não saber que tudo poderia ser diferente e melhor na vida dele.

_A minha personagem má é realista. Pra ela, a vida é a vida e o livro é o livro. Ela rouba os personagens, modifica a história, muda o cenário, quebra a continuidade e a paginação e tenta impedir qualquer final feliz. O seu ponto fraco é fazer-se de dona da história, pois nem mesmo que escreve a história sabe como ela termina.

O líder da equipe disse para montarem a história de forma que parecesse um livro.

Os estudantes começaram a criar e montaram a capa e a contracapa, o prefácio, a história de cada um deles como coautor e, de repente, como se acordassem de um sonho, a professora pediu para que os alunos parassem os trabalhos e o apresentassem para a sala de aula.

O líder da equipe disse que faltava montar a história e perguntou se poderia deixar para outro dia a apresentação.

A professora disse que não poderia permitir porque era um exercício de criatividade literária.

Assim houve um livro com muitos personagens que ainda não foi escrito e fica como um poema a ser pensado.

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