Ninguém quis conhecer Maria. Ela apareceu feita e pronta aos olhos de todos. De quem gostava e da rua onde brincava, restaram fotos de um lugar distante em outro país onde as crianças não mais se viram. Tinha correio, mas adulto leva carta de criança aos correios? As crianças crescidas ficaram com vagas lembranças de uma amizade que não frutificou, a distância separa os pensamentos e os sentimentos em formação.
No outro lugar, Maria morou por pouco tempo, depois se mudaria novamente e acumularia distâncias desconhecidas ao espírito.
Maria estava adulta e ninguém sabia dela. Às vezes, ela se sentia num interrogatório: _A que horas você se levanta? A que horas você se deita? Que livros você lê? Que músicas você escuta? Qual é o seu prato preferido?
Todos conheciam a Maria pelo nome e tentavam decifrá-la, como se fosse um código secreto, pelos hábitos da sua rotina. Maria sabia disso.
Maria precisava mudar esta situação, alguma pessoa nesse mundo haveria de conhecê-la. No entanto, não seria no mundo de perguntas e respostas; nesse mundo a vida não passa de um questionário.
Ela saiu do mundo de perguntas e respostas e entrou para o mundo dos que sentem. No mundo dos que sentem, ela ria, chorava, discutia, e provava comidas novas. O espírito com sabor de sobremesa com açúcar e com adoçante.
Até ali, ela não tinha a consciência do que era ser humano, ser humano era saber de uma pessoa através de uma lista de gostos e desgostos.
Maria não tem como contar o que sentia lavando os lençóis no tanque, mas conhece alguém que lava roupas no tanque. Maria não tem como dizer do dia em que comeu cebolas fritas e gostou de comê-las pela primeira vez na vida, mas tem um amigo que experimentou quiabo a semana passada e aprovou. Maria conta dos momentos que vivencia, sem se importar se foram bons ou entediantes; os maus momentos são iguais, então ela não conta deles. Sofrer sozinho é coisa que todo o mundo faz, difícil mesmo é compartilhar os outros momentos com o coração limpo que nem pano de prato branco.
Maria encontrou o seu jeito de se mostrar longe do mundo de perguntas e respostas, o mundo de compartilhar experiências, aprendizados nos gestos e gostos modificados ao longo da existência. Nesse mundo apareciam os afetos sumidos nos questionários de compatibilidades e aptidões personalizadas. Cabia a ela escolher o mundo no qual queria viver.
14 comentários:
Sempre temos de escolher como queremos viver e ser!
Mesmo que vivamos como estrangeiros no mundo escolhido, pois o que importa mesmo é nos assumirmos em tudo!
Abraços amiga!
Ivone
PS. Muito obrigada por seu comentario sobre o video do meu neto, pois nem fazes ideia como isso me incentivou a incentivá-lo!
Você é uma pessoa especial de alma linda!!!
Todos nós sabemos que apenas viver, não é nada simples, contudo amamos esta vida cheia de complicações e angústias.
Contudo, existem mundos ainda desconhecidos por nós (que as vezes conseguimos visitá-los em nossos sonhos)...rs.
Att.,
Luks
Precisamos viver sim,mas com cautela,e sempre assumindo os desafios que não são poucos...
bjssssssssss
Tudo é inevitável escolha!
Um dia abençoado pra vc!
Nos encontramos no Alma beijo!
Sentir-se inadequado é uma constante.
Beijos.
Viver como um estrangeiro nunca é fácil, mesmo que seja somente mudando de cidade ainda criança em seu próprio país, vínculos ficam deixados para trás.
Mas todos tem que saber lidar com o modo em que vão viver.
Ótima semana pro cê!
Bjs.
A vida em si já é um desafio, mas tem que ser vivida com cuidado!
Um beijo
Lembrei-me de "O estrangeiro" de Albert Camus. Ser diferente implica a marginalização do gupo de pertença. Escolher - é sempre uma opção a considerar.
Um beijo
Interesante entrada, cada cual elige su modo de vida con sus pros y sus contras.Besitos.
a vida é assim mesmo: cada um dentro do seu espaço, e sempre com a coragem em viver a vida, sem olhar pra trás .
beijinho, yayá .
É todos dizem que conhece a Maria, mas ela é apenas uma pessoa em busca de si mesma.
gostei do seu post. Um abraço
Yayá, Viver no mundo do sentir...mesmo que seja o gosto de cebolas fritas.
Pequenas coisas nos fazem "gente".
beijos
Há pessoas, que se sentem sempre estrangeiras. Tive muito receio quando "tirei" meu filho da convivência do grupo de amigos/colegas por força de transferência de cidade. É tão importante, a socialização desde tenra idade...
Seus textos levam sempre à reflexão, Yayá. Gosto!
Um beijo,
da Lúcia
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