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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

sábado, 23 de junho de 2018

Essa história... Miniconto


Essa história...

     Não é lenda do local e dos acontecimentos, são do jeito que são.
     _Que história é essa de não sair depois das cinco horas da tarde?
     São os bons conselhos daquele vilarejo. Ninguém sai depois das cinco horas da tarde sem que tenha automóvel e alguém da família fique olhando até que o familiar entre e feche o portão.
     É curioso, porque embora ninguém na região seja endinheirado, o perigo existe e assusta. Melhor é acordar às cinco horas da manhã e esperar o dia clarear para ir buscar o pão do café da manhã.
     _Não saia antes do dia clarear.
     O povo da localidade conta os casos de roubo de celulares e de limpa de objetos nas casas. Já houve até quem ficasse sob a mira de bandidos dentro de casa.
     Há anos que é assim. Olhando por este ponto de vista é impossível sentir saudades do lugar. O costume é tirar uma soneca durante o dia e cada um no seu horário para que todos os vizinhos acordem durante a noite e deem uma olhada na rua e na janela dos vizinhos para saberem que os outros estão bem.
     Não se sabe de onde aparecem os moleques que assustam a redondeza porque do bairro não são, mas existem.
     Parece que houve uma casa assaltada no início do ano e os ladrões fugiram em suas bicicletas, eram jovens. Conseguiram até mesmo filmar os bandidos, mas o boné tira a fotografia do rosto e eles são rápidos.
     O lugar era assim antes que os forasteiros chegassem.
     Causava medo quando os desavisados ignoravam os acontecimentos e saíam depois das cinco horas da tarde. Essa desobediência aos costumes do lugar, diziam alguns, trazia azar para a pessoa.
     Não era lenda, trazia mesmo. Todos os que não obedeciam essas regras conseguiam algum tipo de sofrimento.
     Os forasteiros estão surpresos com esses costumes, mas é assim já há algum tempo.
     Não se sabe quando foi que tudo mudou. O lugar era pacato e, nas noites quentes, costumava-se colocar as cadeiras no quintal ou na varanda, para quem as tivesse e levava-se também refrigerantes, rádios e livros, além de aproveitarem uma boa conversa com os vizinhos.
     Nas noites dos finais de semana, sexta-feira e sábado, era uma alegria no vilarejo, pois as crianças andavam em suas bicicletas, os jovens flertavam na praça e quem gostava de locais mais pesados, íam para a mesa de sinuca.
     Os forasteiros trouxeram com eles o silêncio e as poucas conversas e, pelo que contam, em nada mudou os costumes do lugar.
     Absurdo para eles, os forasteiros, mas para quem sabe dos costumes do lugar, sabe que tem que levantar à noite e dar uma espiada na rua.
     Até mesmo o horário de saída para trabalhar de cada um dos moradores é conhecido dos demais.
     Alguns levantam às três da manhã, ou alguém imagina que o pão fresquinho e crocante das sete da manhã amanhece feito?
     Outros chegam em casa por volta das onze horas da noite, são aqueles cujos familiares esperam até que o portão seja trancado.
     Todos têm os telefones de pelo menos quatro vizinhos, é para poder telefonar caso aconteça alguma coisa.
     Nos outros lugares a vida corre normalmente, mas ali parece que nunca mais será o mesmo lugar.
     Nunca se acusou ninguém da região porque uns conhecem os outros e os bandidos surgem do nada e somem do nada. Dizem que ficam rondando o lugar.
     Há mais de dez anos que é assim e as mães recolhem as crianças cedo e não deixam que brinquem no quintal à noite.
     Algumas famílias mudaram-se do lugar como foi o caso de uma mãe que viu a filha ser assaltada de dentro da janela da sua casa e ficou sem poder defender a moça que voltava do trabalho.
     Outras famílias pensaram em sair do local e desistiram, são idosos que não saem à noite, para os quais o período das sete da manhã até às cinco horas da tarde é suficiente para tratarem dos seus afazeres.
     Alguns filhos desses idosos ficam deveras preocupados com mães e pais, dirigindo-se até eles a qualquer hora do dia para atendê-los.
     Políca tem e câmeras de segurança também, mas a situação é difícil até mesmo para quem faz a segurança.
     A pergunta que se faz é onde é que esses bandidos se escondem porque ninguém consegue saber como é que desaparecem durante o dia e no final do dia retornam.
     Uma senhora foi aconselhada a não sair ao cair da tarde sozinha e nem chegar com parentes ao lugar de madrugada.
     Agora chegaram os forasteiros e perguntam que história é essa.
     Não é história, não tem nenhum bandido igual àqueles perigosos que aparecem na televisão.
     O mistério é esse. Não é ordem de ninguém e todo o lugarejo cumpre essas normas de segurança porque precisam morar naquele lugar.
     E tudo isso para que o lugar não pareça mal assombrado, se bem que agora podem colocar a culpa em algum bandido fantasma, pois a crendice e a lenda são conhecidas de longa data.
     Agora, se além desses misteriosos bandidos, aparecem assombrações, o lugarejo ficará inabitável.
     Cada lugar tem suas histórias e não se sabe quando é que um lugar começa a ser um mal lugar, mas todos desejam mesmo é permanecer em saúde e confiança em relação ao seu lugar.
     Absurda é essa história pela realidade com a qual se apresenta, mas não é para quem já se acostumou a ter que conviver com ela.
     Essa história não é história.          

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