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O blog da Nina, menina que lia quadrinhos.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Crise de Apêndice

Crise de Apêndice
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Cecília teve uma crise de apendicite e teve que fazer a cirurgia. Ela e o marido eram relações públicas dos franqueados da empresa Chocolates SA.
O marido, Humberto, deixou a filha tomando conta dos negócios enquanto a mãe tratava da saúde, mas recomendou a ela que dissesse que passaram o final de semana viajando e resolveram prorrogar o passeio por mais alguns dias. Era mais fácil a desculpa do que a explicação técnica da pequena cirurgia aos mil e setecentos e cinquenta e dois associados, que desejariam melhoras e pronto restabelecimento. Folga é desculpa melhor que doença, ossos do ofício dos profissionais de relações públicas. Se houvesse alguma complicação, contariam aos associados; se não houvesse passaria por folga mesmo.
Dezoito anos, dois dias de substituição nas funções da mãe, Eulália pensou que seria fácil.
Chega à empresa a franqueada para repor o estoque de chocolates da sua loja, compra e depois de saber que a moça era a filha, pergunta o peso da garota.
_Você é jovem, cuidado para não engordar.
Chega outra franqueada, a mesma conversa:
_Não deixe de comer chocolates. A juventude permite guloseimas.
Agora entra um homem lojista;
_Avise à sua mãe que eu não entrei nesse negócio de chocolate para os consultores tirarem férias fora de época. Se eu que não vender chocolates este mês, será o bastante para exigir o meu dinheiro da compra de hoje de volta.
Na hora do almoço, Humberto liga para saber dos negócios e a moça conta.
_Filha, coma os mesmos chocolates que você costuma comer, nem a mais e nem a menos, pelo menos agora que precisamos de você. O comprador venderá o quanto ele for capaz de vender, nem mais e nem menos.
Depois do almoço chega ao escritório a conhecida senhora que sabe da vida de todo mundo.
_A sua mãe não está? O seu pai também? Que bom que eles estão passeando, com tanta gente doente por aí. A Silmara com gripe, a Rogéria com virose, a Celeste com crise alérgica, a Romilda com bronquite, o Arnaldo com espondilite, a Silvana com artrite e a sua mãe?
A filha cansada de ouvir aquele relatório médico sobre os conhecidos, responde:
_A minha mãe com apê... Apartamento de resort ou de hotel.
A freguesa pergunta quando ela volta exatamente porque ela quer comprar o novo bombom, mas precisa das informações sobre a aceitação do produto no mercado.
_A minha mãe volta, volta, volta, hã, quando ela quiser. Não, quando ela quiser não porque ela gosta de estar aqui junto a todas vocês, senhoras comunicativas e compradoras, por que não dizer que mamãe também visa lucro? Não há porque se sentir constrangida em dizer, todos vocês visam lucro.
A freguesa ouviu a moça e diz:
_Não me diga que a sua mãe não pode mais comer chocolate! Era a paixão dela. Ela não era relações públicas daqui por dinheiro, era por paixão.
A moça pediu à freguesa que ligasse e conversasse com a Cecília quando ela voltasse de viagem.
A freguesa foi embora. A filha, nervosa liga para o hospital para saber da mãe e o pai diz que a cirurgia demorou menos tempo do que extrair um dente do siso encravado no osso. No dia seguinte poderão estar em casa.
Entra o outro comprador:
_Ah! Temos gente nova por aqui. A Cecília nunca me deu confiança, quem sabe esta linda garota queira sai comigo.
Ela ficou com fisionomia de paisagem e perguntou o que ele queria comprar.
_Eu quero algo tão belo e doce quanto o seu sorriso a me ver entrar nesta sala.
A moça disse que não tinha e ele que voltasse outro dia que encontraria a antiga megera na função.
Tudo volta ao normal na segunda-feira, todos nos seus devidos lugares, quando a Cecília recebe os telefonemas:
_A sua filha precisa cuidar-se, estive aí e ela estava distraidamente devorando os chocolates com os olhos. Ela está bem?
_Eu não dou chocolates à Franciele, eles dão acne. Cuida da sua menina, a pele dela está ficando oleosa.
_Cecília, como está você? A sua filha disse que você não ama mais o negócio de chocolates, que agora o seu único prazer é o lucro! Conte comigo se estiver em dificuldades.
_Cecília, aqui é o Francisco. Tratei bem a sua filha e disse que ela está uma bela jovem. Ela disse para que eu voltasse quando a megera estivesse aí. Fiquei espantado com a atitude dela. Onde se viu te chamar de megera.
Terminado os telefonemas, Cecília liga para o marido e diz que agora é o fígado que a incomodava, não o dela, mas aquele que ela iria comer no jantar: o da filha.
Como diz o chavão: Tudo Está Bem Quando Termina Bem.
No dia seguinte mãe e filha iam juntas ao trabalho. O marido ficou vendo futebol, quem merecia o descanso era ele. Não queria nem saber no que iria dar tanto apêndice.

5 comentários:

Marisete Zanon disse...

Você e o seu jeito descontraído em suas crônicas. Adorei! É bom ver que está de volta com toda força.
um abraço!

Silenciosamente ouvindo... disse...

Tema interessante à volta de
uma operação à apendicite.
Contada mtº. bem, como é hábito
por si.
Desejo que esteja bem.
Beijinhos
Irene Alves

Jossara Bes disse...

Oi Yayá,

Muito legal!
descreves muito bem cenas do cotidiano.Ao te ler, parece que estou vendo um filme.
Beijos!

Eloah disse...

Querida você é uma excelente contista.Adoro ler estes casos que escreves lindamente.Parabéns.Brisas e flores para você.Bjs Eloah

Bergilde disse...

Que grande confusão,mas é assim mesmo na vida onde muitas pessoas estão mais interessadas em lançar comentários negativos à vida dos outros.Acho que teria feito o mesmo que os pais da Cecília.
Abraços meus,